sábado, 31 de janeiro de 2009

Tropeço


Dançamos dança leve vontade de mais dançar. 
Ele conduzindo fácil, eu indo sem tropeçar. 
Na vida porém vivemos
 Tropeçando sem parar. 
Em momentos breves, 
em entraves passageiros,
 em tristezas leves, 
em desentenderes ligeiros. 
Depois sempre voltamos a nos procurar 
de novo nos querendo a nos mesclar e juntar. 
E assim ficamos, 
em nó apertado,
a nos completar. 
Nó forte e atado 
que como tontos teimamos, 
em tentar desatar. 

Porque terá tropeçado A minha vida na tua? 
31/01/2009

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

E-mail

Quando o e-mail chegou
entrou em parafuso.
Não sabia como agir,
Não sabia o que responder,
Não sabia se relia
ou se realmente havia entendido tudo.
As palavras calaram fundo.
Não sabia se deveria alegrar-se
ou se era ocasião para tristeza.
Manteve-se inerte,
olhos parados na tela.
E agora?
Lembrou-se de que era,
simplesmente,
um e-mail.
Deletou,
apagou dos deletados,
desligou o computador,
e foi dormir.
20/06/08

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Fosse...

Se eu fosse você eu me dava um abraço apertado.
Sorria pra mim e me beijava muito,
como quem morresse de saudade 
Se eu fosse você eu sorria pros meus olhos 
e me dizia que coisa boa era estar comigo em qualquer momento.
Se eu fosse você eu me dava beijinhos, 
me contava histórias e me acariciava os cabelos. 
Ah! Se eu fosse você eu ia me amar tanto que nem ia caber 
e ia ser tão feliz de estar comigo, que nem parava de rir e de achar a vida boa. 
E ia me chamar prá passear, ia me contar coisas e num repente calar 
e, abraçado comigo só olhar a natureza e nada mais. 
Se eu fosse você eu me contava o seu dia,
ria das coisas boas e dividia comigo as ruins.
E me contava o que tinha aprendido de novo, 
porque a cada dia seria bom aprender um desconhecido.
Se eu fosse você eu escutava as minhas histórias
e me interessava por elas e ria comigo. 
Ah! Se eu fosse você eu não ia nunca
esquecer de mim.

sem data

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Regaço Vazio

E então te vi partir.
Teu rosto querido,
teu falar destemido
teu corpo sofrido em solidão,
perdido.
Te vi partir
por minha descrença,
na real capacidade
de viver tua presença.
Te vi partir com meus medos
minha ansiedade,
meu pensamento a gemer,
meu bem querer,
minha insaciedade.
Foi-se contigo o fim de semana,
o nirvana beijado,
a risada livre
o sabor desconhecido,
o desejo alado.
Foi-se contigo a borboleta que,
abobada,
nos olhava pela janela fechada,
querendo entrar.
Foi-se
minha inconsistência,
minha irrelevância,
minha impermanencia
meu terror
meu temor do amor.
Contigo partiu minha tentativa
do desconhecido.
Foi-se a destemperança,
meu bem querer contido,
o poeta, o escritor, a criança,
o meu amigo querido.
Contigo se foi
minha vã tentativa,
meu amar foragido,
meu sorriso incontido.
No regaço o vazio,
de teu olhar desvanecido,
um aniversário perdido
meu desvario,
meu coração partido.
02/08/08
Tudo a ver
" E quanto mais ambiciosa e delicada é a alma, mais os sonhos se afastam do possível. Cada homem leva em si sua dose de ópio natural, incessantemente secretada e renovada, e, do nascimento até a morte, quantas horas temos nós de alegria positiva e de ações bem-sucedidas e decididas?"
Charles Baudelaire - "Pequenos poemas em prosa" - "Convite à viagem"

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Perigo

Lembrei-me daquele dia em que você andava de um lado para o outro na sala da minha casa, percorrendo sempre o mesmo caminho. Eu olhava do sofá escutando as coisas que você, sem parar de andar, me contava. Naquele momento eu soube como seria difícil sentar no sofá e não ver você ali, andando de um lado para o outro. Enquanto você falava me dei conta de que nossos pequenos momentos preenchiam tanto os espaços da minha morada interior que me apavorei ante a possibilidade dos vazios que poderiam surgir sem a sua presença. Foi então que insensata e inconseqüentemente, deixei-me levar por este sentimento. Aos poucos foi o medo que começou a tomar todos os espaços que a você pertenciam e foi o prenúncio da sua falta que tomou conta de tudo naquele instante, causando-me uma dor tão grande, tão profunda e tão forte que daquele momento em diante comecei a fugir. Fujo até hoje. A felicidade é perigosa demais. 2 de novembro de 2004.

sábado, 17 de janeiro de 2009

O homem diferente

Naquele carnaval, chegando de viagem, encontrei um homem diferente. Camiseta amarelo ouro (cor que em momento algum ousara usar), óculos escuros (que nunca tivera) e bermudas caqui. No quarto do hotel, em cima da cama, esperava-me uma fantasia: florida. Ao lado da dele: igual. Ingressos para o baile sobre a mesa, embarquei no mundo daquelas duas fantasias. Entreguei-me, fascinada, ao enredo que ele havia cuidadosamente preparado. Na hora do baile vesti-me e, a seu pedido (coisa que não era de seu feitio), deixei que me enfeitasse: pintou meu rosto, amarrou pulseiras no meu braço, perfumou-me e encheu meus cabelos de flores. Dançamos a noite inteira, provocamos um ao outro, rimos e bebemos; demais. Amanhecemos o dia dentro do carro, abraçados, atracados e exauridos, sem roupas, no estacionamento do hotel. Eu e o homem diferente. Aquele que, que pena, deixou de sê-lo e não percebeu que pouco a pouco me perdia. Aquele que achou que mesmo que se tornasse igual aos outros, eu jamais o deixaria. São Paulo, 2 de novembro de 2004.

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

O fim da praia

Série Juquehy - escritos ao mar

Dizem que de um lado até o outro da praia são cinco quilometros, ida e volta. 
Temos percorrido esta distância de duas (no minimo) a tres vezes por dia, fora o que andamos na rua quando necessário. 
Um dia vi uma senhora que rezava apoiando o corpo em suas duas mãos, em uma pedra grande, no final da praia. Meus pensamentos voaram enquanto a olhava, quero rezar lá também! 
Hoje encontrei a pedra vazia e lá encostei o peso do meu corpo em minhas duas mãos, firmemente, na pedra grande. Então pedi a Deus que me ajude a não sofrer tanto para tomar decisões e que as que iniciaram este ano tenham sido acertadas e senti a pedra com as mãos, os pés firmes na areia. Pedi força para meus filhos, para mim, para os que me são queridos e então eu soube: sou forte quando deixo que o mar me renove, me perdoe os erros e me purifique; sou firme quando entrego minha solidão à sábia natureza pois preciso dela; sou correta comigo mesma quando defino o que mais me assusta; respeito o sentimento dos outros e me importo (muito) com os sentimentos que causo; e sou pedra dura de coração mole porque por amor me derreto toda. 
Haverá quem me recolha o derretimento e dele se aposse, como uma pedra.
Juquehy, 03/01/2009.
Tudo a ver
"Pensamentos assim são um sintoma do avesso. E o avesso é a superfície correspondente, igual em tamanho e forma, a tudo aquilo que você considera o direito. Conhecer de-cor-e-salteado o direito absolutamente não dá direito a conhecer também o outro lado. Sinto muito, mas ele sempre está lá. Incognito, invisivel inviável. In, enfim."
Caio Fernando Abreu em "Pequenas epifanias" - "Lição para pentear pensamentos matinais".

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Assim fomos

Série Juquehy - escritos ao mar
Fomos por escrito nós dois
No despertar das possibilidades 
No combinar do primeiro encontro
No comentar do despertar das saudades.
Fomos por escrito nas brincadeiras 
Na troca de sérios e besteiras.
Por escrito fomos no complexo 
E até mesmo no tatear do amor e do sexo. 
No pouco de real que nos tivemos 
No que trocamos e no que nos demos 
Não soubemos nos prender a um futuro 
Mas nos trocamos de um modo terno e puro. 
Não fomos loucos o suficiente 
Não nos demos à paixão demente 
Mas fomos próximos e nos ajudamos 
E um pouco um ao outro mudamos. 
Cada vez mais nos abrimos 
Nos mostrando como somos 
Mas sabendo do futuro nos sorrimos 
E por escrito nos fomos.

04/01/2009

Capricórnio


Série Juquehy - escritos ao mar

 


Era 1999 e havia um mar em uma praia que se chamava Capricórnio. 
Jamais esquecerei nós dois naquele fim de dia, com o mar que se mexia, o corpo a balançar conversando, conversando, você lá e eu cá, eu cá e você lá. Isso no mar que Capricórnio se chamava mas como pôde tanta coisa acontecer depois desse começo de balanço de mar morno? Houve o beijo de susto e o negar do beijo e o dedo do pé que se quebrou e a viagem através da serra, coração disparado de amor novo anunciado. Destemido, maluco, ousado, paixão louca faz tanto, tanto tempo! E então é sempre o mar que traz de volta 1999, 2000, 2001 e sempre você no mar e um dia inda tiro o mar de você e vai ficar só meu não dou, não devolvo mais mas por que será que você se apossou e ninguém toma o mar de Capricórnio e aonde, aonde está aquele você e o que era eu e o que éramos nós, depois de tanto, tanto tempo? 

Juquehy, 03/01/2009 

Tudo a ver 
"De onde vem essa iluminação que chamam de amor, e logo depois se contorce, se enleia, se turva toda e ofusca e apaga e acende feito um fio de contato defeituoso, sem nunca voltar àquela primeira iluminação?" 
Caio Fernando Abreu em Pequenas Epifanias - "Anotações Insensatas"

Sem vazio

Série Juquehy - escritos ao mar
A vida grita. O mar está lindo, a amiga dorme na cadeira ao lado. O ano começa leve, os amores ao longe porque perto não me tiraram, nenhum deles, o vazio. Começo 2009 sozinha e, de repente, o vazio se foi. 01/01/2009

Boemia Bohemia

Série Juquehy - escritos ao mar
No caminho de volta da praia (quanto andamos!) havia dois homens-meninos. Podiam ser nossos filhos. No começo não entendemos por que queriam nos dar cerveja. Depois acreditamos: tinham cerveja demais para carregar. Nos deram duas: uma para ela, uma para mim. Pedi que abrissem porque estava sem forças nas mãos. O careca abriu a minha, o bonitinho abriu a dela. Brindamos, Feliz ano novo!
E viemos ela e eu embora, cada uma com sua garrafa de Bohemia bem gelada. Achamos que o acontecido era um bom pressentimento e, eu pensando, ela sem pensar, rimos pelo ano novo que prometia ser cheio de imprevistos. 01/01/2009
2009 será verde. Um ano, muitas esperanças.

Buracos no mar

Série Juquehy - escritos ao mar
Havia buracos no mar, subidas e descidas, fiquei com medo de tropeçar, torcer o pé, esse tipo de coisa que poderia atrapalhar meu caminhar diário que tem me feito tão bem.
De qualquer maneira achei estranho aquele piso de mar tão esburacado deve ter sido durante a noite que o mar se revoltou, algum mau humor da natureza provocou rodamoinhos que deixaram buracos perigosos.
Entrei de mansinho tateando o chão com os pés, agora entendo o medo de cair dos velhinhos que não conhecem mais os caminhos e teem medo de se machucar.
Se você tiver medo de andar mãe, segure-se no meu braço, eu terei paciência de andar com você. Não tenha medo eu irei com você, por favor não vá sem me chamar.
Vamos desviar dos buracos enquanto conversamos sobre a cor das flores e os seus olhos brilham e você diz "mas como estão lindas as flores!".
Tem razão mãe, as flores estão lindas e que bom poder estar ao seu lado e ajudar você a não cair.
Juquehy, 31/12/2008

Dito sem dizer

Série Juquehy - escritos ao mar
É simples de dizer, muito simples, não sei porque não sai assim como um poema, ou como um espirro, ou com uma leveza ímpar como um rufar de asas de uma borboleta ou de um passarinho bem pequeno, desses coloridinhos que fazem ninhos no meio de plantas coloridas. É simples de dizer, muito simples, é dessas coisas que todos tem de dizer uma vez ou outra, ou já disseram ao menos uma vez. Fico pensando se haveria alguém que ia dizer mas fica olhando o mar e divagando e acaba passando a hora do que era para ser dito e então entra no mar e, como eu, se molha e nada e mergulha e o mar vai lavando tudo e purificando tudo e nada mais importa. É simples de dizer, muito simples, basta olhar e abstrair algumas coisas que atrapalham o dizer porque sempre há outros lados que merecem um não dizer do que dever ser dito e por isso algumas vezes não se diz e acaba-se não dizendo e de nada adianta porque uma hora a coisa vem fora de hora e o dizer tem de ser dito, tipo de coisa que não dá para escrever, tem de ser falado olho no olho nem que doa ou nem que só o olhar já diga e deve ser por isso que apesar de simples sempre tem dois lados e acaba nem sendo tão simples assim e parece que enquanto se pensa em falar o próprio interior vai desdizendo tudo e o pensamento do que era definido perde a força e sem força nada diz. É simples de dizer, muito simples, tão simples que mesmo que não se diga já é definido e já se comporta como um já dito e pra que dizer, se você já sabe? Juquehy, 31/12/2008 Tudo a ver "Dor branca, querendo primeiro comrpeender, antes de doer abolerada, a dor. Doeria mais tarde,quem sabe, de maneira insensata e ilusória como doem as perdas para sempre perdidas, e portanto irremediáveis, transformadas em memórias iguais pequenos paraísos-perdidos. Que talvez, pensava agora, nem tivessem sido tão paradisíacos assim" Caio Fernando Abreu em Pequenas Epifanias - "Anotações insensatas"