segunda-feira, 30 de março de 2009

Conversa

Ela gostava de explicar;
Ele, de resumir tudo em uma frase.
Ela falava sobre o seu dia;
Ele, apenas sorria.
Ela fazia planos;
Ele, escutava.
Ela gostava de perguntar;
Ele, detestava responder.
Um dia ela ficou quieta,
Ele também.
Ela detestou;
Ele, achou ótimo.
 24/09/07

Cordilheira

Estou gelada, inerte.
Nada vejo ou faço.
Também não penso.
De que adiantaria?
Imobilidade sem sentido,
Inatividade impassível,
olhar turvo.
Estado de catarse?
Não sei.
Indefinível talvez...
Imagino-me longe.
Olho para o alto
e num repente me vejo.
.
Lá estou eu.
Vulto inabalável,
no pico íngreme
de uma cordilheira em neve.
5/09/07

quarta-feira, 25 de março de 2009

Simulacro

Apesar do sol que entrava pela janela, sentia frio. Na poltrona, corpo magro, cigarro abandonado na mão direita, olhar perdido, era um daqueles dias (como se chamavam mesmo? Dias brancos? Dias neutros? Dias nada?), Em que nenhum sentimento parecia se fazer presente e somente o abandono tomava conta de tudo. Som baixinho escutava Ruth com Egberto Gismonti, nome que o fazia lembrar outros nomes já tão longínquos, nomes que se haviam tornado um tão pouco, um quase nada, idos, findos, vez em quando ainda re-mexiam, re-moviam vácuos de tempo e, sobretudo re-feriam o corpo todo que passava a doer e traziam de volta o sentimento escondido em pensamentos que acreditava imbuídos no nada pensar, e causavam toda a re-viravolta dolorida e então vinha maldosamente o som de Ella Fitzgerald com o “Mean to me”, can’t-you-see-what-you-mean-to-me? Levantou-se, apagou o cigarro e fez um café. Lembrou-se dela sentada na mesinha redonda, pronta para trabalhar, tomando café com ele, lágrima escorrendo na face, ela não gostava de ir embora, mas mesmo assim ia e sempre teimava em não voltar porque era mulher de sentimentos que de tão profundos ficavam leves demais. Ele nunca entendera como sentimentos podem ser assim, como um rufar de vento e foi então que se deu conta do vento que fazia a janela bater de levinho, apesar do sol (a mulher dos sentimentos de vento cismava em não gostar de vento e sempre fechava as janelas, mas gostava de olhar o mundo através dos vidros principalmente quando havia sol). Daquela janela ele lhe mostrara as árvores, os caminhos que percorria todos os dias e lembrava-se de um (a musica era Luna Rossa com Caetano Veloso - porque sempre havia uma musica), em que olhando pela janela haviam conversado muito com as taças de vinho na mão e anoitecera, depois amanhecera e quase anoitecera de novo, a musica se repetindo ao longe (ele gostava de musica ao longe) e haviam adormecido no sofá, copos no chão. Respirou fundo e as viu chegar, uma a uma, as andorinhas, pousando no parapeito da janela, olhando para ele (ah Luna Rossa!), acreditou que eram as mesmas daquele dia em que ele dissera olha, olha, vieram te ver, ela sorrira abrira a janela bem devagarinho, estendera a mão, ela queria encostar seu rosto, quase conseguiu, uma mansinha chegou bem pertinho do rosto dos dois, roçou a asinha, as peninhas azuis tocando nas faces enquanto de tão emocionados cada um derramava uma lágrima alegre e se abraçavam vendo a andorinha voar e sabiam que nunca mais esse dia seria esquecido e então escutou Ella Fitzgerald que teimava em machucar e cantava “when your love has gone”. Sentou-se na poltrona, acendeu um cigarro e voltou ao seu dia como se chamava mesmo? Dia branco? Dia neutro? Dia nada?
25/03/09

segunda-feira, 23 de março de 2009

ÊXODO

Sentavam-se todos na mesma sala e na maioria das vezes nada diziam. Mas voltavam sempre, porque ali sentiam-se flutuar. Ela preferia a musica bem alta. Gostava dos acordes que pareciam penetrar seu corpo, faziam tremer sua pele, tomavam todos os seus sentimentos. O que gostava mesmo era de escutar e não pensar em mais nada. Só na musica, deixando que os caminhos da mente percorressem o que os acordes ditassem. E como percorriam! Deixava-se ir pelos atalhos, pelas avenidas, pelos becos e os sentimentos iam tomando conta, um de cada vez. Não raro as lágrimas escorriam, o coração disparava, sentia dor profunda e quantas vezes jubilo, um jubilo que extrapolava e então levantava-se e dançava, dançava, olhos fechados, par imaginário ou nenhum, dançando, deixando a musica conduzir. Nem via que havia outros ali. Provavelmente nenhum se via, todos levados pela musica que delicia que era juntar pessoas que gostavam da mesma coisa e podiam ficar assim lado a lado fazendo juntos o que cada um fazia por si só. Quando a musica parava olhavam-se, olhos de lágrimas, olhos sorrindo, olhos tristes, olhos opacos, olhos nada, fosse o que fosse, sentiam-se todos mais irmãos. Às vezes conversavam ou apenas se tocavam e sorriam no silencio enquanto alguém colocava outra musica, às vezes só se olhavam e nada mais era necessário porque sabiam que se entendiam e sabiam que estavam juntos porque comungavam aquela entrega à musica e sabiam que seguiriam aonde a musica os levasse, todos no mesmo caminho, indo sempre para longe, cada vez mais longe, sabendo que iriam para sempre e sempre, juntos.
23/03/09
Tudo a ver
"A moça de óculos disse que sentia muito, mas infelizmente naquela noite não podia baixar o volume do som, não era uma noite como as outras, era muito especial, e perguntou se o síndico não sabia que Urano estava entrando em Escorpião."
Caio Fernando Abreu em "Morangos Mofados" - "O Dia que Urano Entrou em Escorpião"

quinta-feira, 19 de março de 2009

Almoço

Tinha vontade de conhecê-lo mas, medrosa como sempre, não demonstrou. 
Foram várias reuniões e a cada vez ela observava um trejeito, um jeito, alguma coisa...gostaria de poder olhar mais. 
Um jeito de andar despachado, desligado, um jeito de vestir bonito, esporte, um jeito de falar sorrindo, fazendo rir, um sorriso levantando o cantinho da boca, um queixo bem feito, e quando colocava os óculos, um charme! 
Um dia tirou o casaco do sempre terno no meio da reunião,calor, falou, ela se importava? Não, absolutamente, ficasse à vontade. 
O jeito de tirar o paletó e colocar no espaldar da cadeira, o jeito de levantar, o corpo ainda bonito apesar da madurice, parecia praticar algum esporte, ficou curiosa mas não perguntou, falou das cifras, perguntou valores. 
Houve uma ocasião em que se pegou olhando as mãos dele, depois olhando a boca, lábios, ai a boca, os lábios, perdeu-se um pouco, escapou-lhe o assunto, será que ele percebeu? 
Lembrava-se também do dia em que se levantara para pedir um café e ao voltar viu como ele a olhava, ou será que era impressão? Sorriu, fingiu que não viu, o café já vem, vamos continuar? 
Ali ele na sua frente, então ta, marcamos a próxima para a semana que vem?
E então ele disse: e o fim de semana? Hã? Como? 
Isso, o fim de semana? Podemos nos ver? 
Tremeu. Nos ver?
Que tal almoço? 
Quase tropeçou, coração disparado, ele percebeu, segurou seu braço. 
Então ela olhou bem nos olhos dele e sorriu. 
Almoço!
19/03/2009

Ferida

Abri a janela, amanhecia o dia, uma borboleta branca entrou. Voou pela casa, visitou os cômodos e, decidida, pousou no sofá. Cheguei perto de mansinho, deixou que eu me sentasse ao lado, fiquei, ficou, ficamos paradas, cada uma com suas recordações. Vez em quando balançava as asinhas e eu pensava não vá ainda e acho que escutava porque pacientemente ali ficava, alimentando meus pensamentos que voavam, a ir e vir. Então mexeu-se novamente, levantou um pequeno vôo e, decidida, pousou delicadamente em mim; branca, leve, arrojada, linda, e de tão linda remexendo lembranças e de tão linda abrindo, de novo, a ferida. Tenho saudade de ti. Ai que saudade dolorida tenho de ti!!!! 18/03/09

quarta-feira, 18 de março de 2009

Você e eu

De novo você e eu. 
Música e conversa gostosa, carinho e carinho.
Como se fossemos algo mais do que não somos, 
ou além do pouco que por vezes somos. 
Mas muito do que sentimos, mil vezes transborda 
e nos envolve como se em nenhum momento nos separássemos. 
Como se nos cuidássemos e nos regássemos 
com água pura, livre de qualquer contaminação. 
Livre, de qualquer amarra. 
Livre de tudo que não nós dois envolvidos,
puros, e cheios de luz.
  9 de fevereiro, 2001

terça-feira, 17 de março de 2009

Tormenta

Sim eu sei. Devemos seguir acreditando. Mas há vezes em que parece tão impossível!!! Não sei porque me vem esta frase. Deve ser a muita champanhe que tomei no aniversário da amiga. Eu sei... Um dia há de vir o amor verdadeiro, aquele que completa e que faz companhia e que fala a mesma língua e que casa a pele com pele. Mas não veio ainda e ainda não veio e ainda não veio e algum dia vem. Sempre algum dia. De nada adianta o que me aparece sem que seja o que complete e não completa o que vem mas que não é. Sou das que persistem porque acredito naquela coisa de que para cada um há outro e cada um há de ter um que lhe complete mas também acredito que se não for para completar melhor não ter. Quem foi que disse mesmo, que as metades se procuram e que a cada metade corresponde uma outra com aquilo que lhe falta? Sei, eu sei quem disse mas sei também que viveu há muito e que já nem vive mais e que as coisas foram se sucedendo num suceder de tantas coisas e que fomos todos nos perdendo no meio de tanta gente. Só sei que hoje andei na avenida Paulista logo cedo, cheia de planos de um caminhar saudável mas só havia poluição e havia massa de pessoas apressadas e feias (cadê as pessoas bonitas do meu pais?) que atravessavam a rua comigo e o que foi feito meu Deus do meu pais tropical e lindo e cheio da natureza que não mais encontro? Assim mesmo andei e caminhei e respirei fundo nove vezes para renovar todo o ar do meu pulmão que renovado ficou com a fumaça dos ônibus enquanto atravessei o parque Trianon. O que foi feito das flying saucers in the sky e do peace and love e nem há mais o ame-o ou deixe-o porque já nem se sabe o que é amá-lo, apenas se está nele sem saber bem porque. Eu o amei a este país, e quando de longe, senti o que é não tê-lo quando aqui não estive e o quis tanto e o sonhei de mil formas e o planejei com aquela ansiedade de algo que parecia tão possível. E então o vi minguar e minguar e conforme minguava de um lado mais populoso ficava de outro e a turba atravessando a rua olhava para o chão porque não aprendeu a olhar para o céu e a sonhá-lo. Eu o sonhei um dia. Um dia sonhei um país que podia ser, um amor que podia ser, uma vida que viria. Veio interna mas externa não a vejo. Veio uma realidade na qual não me insiro e fico aqui, a me individualizar quando queria comungar. E subo a Pamplona, entro na Paulista e ando na rua que não é aquela, no país que aquele não é, na eu que não pertenço, nem àquela rua, nem àquele momento, nem àqueles aconteceres que tecem um destino que não, não pode ser o meu. Madrugada de 17/03/09

segunda-feira, 16 de março de 2009

Poesia

Quando olhos não brilham, poesia? Quando inspiração não vem, poesia? Quando peles não conversam, poesia? Quando lógicas não casam, poesia? Quando ilusão morre, poesia? Quando omissões e traições, poesia? Quando esperanças se acabam, como fazer poesia? 16/03/09

quinta-feira, 12 de março de 2009

Fumaça

Tire-me desta fumaça por favor, estou sufocando. Você não está vendo? Vem de todos os lados, não sei como consegue respirar. Já não sei mais o que fazer. Ando como se estivesse nadando, dando braçadas para abrir caminho até você. Tudo negro, só você não vê. E a fumaça que sai de nossas bocas quando falamos? E o rastro que nossas mãos deixam quando se movimentam? E a falta de ar que nos faz tossir? E os olhos? Porque sai esta poeira dos seus?
O ar puro se foi, o sol já não nos alcança, tudo se atrapalhou. Fumaça é tudo o que temos para trocar. 12/03/09

Feijão

Destampou a panela e colocou o rosto sobre o vapor. Se ficasse ali algum tempo será que as gotas de suor cairiam sobre a comida, la dentro? E as pessoas, perceberiam o gosto da sua pele entre os temperos? Que nojo!!! Afastou-se mais do que depressa. Que maneira mais estranha de encher a cabeça para passar o tempo! O ato de cozinhar tornara-se mecanico demais e subterfúgios como este eram necessários para que não enlouquecesse por completo.E se espirrasse um pouco de perfume dentro da comida, bem pouco, será que faria mal para as pessoas? Sim, devia confessar que um pouco desnorteada, já estava. Como não estar, fazendo aquela mesma coisa todos os dias? Fazia, eles comiam, ela lavava; fazia de novo, eles comiam, ela lavava; no dia seguinte começava tudo de novo. Não é que não gostasse de cozinhar,mas há muito não sentia prazer algum. Precisava de novidades. Fazer uma nova receita? De que adiantaria? Juca só comia arroz se acompanhado de feijão; Cibele não gostava de salada; Carlota só comia carbohidrato; ninguém gostava de peixe; macarrão só com molho de tomate; bife só muito bem passado; batata sempre....Tudo muito cansativo. Fora os temperos: sem salsinha para um, com muito louro para outro, nada de orégano, só uma pitada de pimenta, bem pouco... O ato de cozinhar tornara-se tão morno, tão desprovido de elogios.... Foi então que teve a idéia. Modificaria as coisas. Queria ver se não reparariam. A cada dia não faria para um deles bem aquilo que repetidamente comia, dia após dia. Ficou contente! Começaria hoje. Isso! Feliz começou a descascar batatas! Hoje Juca, se quisesse arroz, teria de comê-lo sem o seu feijão. 12/02/2009

segunda-feira, 9 de março de 2009

Colar


Quero pele macia contra meu corpo, 
arroubos de noites de não dormir, 
quero volúpia, entrega, desvario, 
gemer, querer, sorrir. 
Quero perder-me do mundo num roçar de lábios, 
como as contas macias do colar em meu pescoço. 
Quero, como o das pérolas, o brilho de velas, 
a luz difusa, a sussurrar desejos. 
Quero lampejos! 
Quero o enlaçar de braços
desejos unidos, corpos despidos, 
arfares, rufares e beijos. 
Quero fusão, 
quero perder-me sem aviso de antemão, 
de ilusão.
Quero paixão!
09/02/09
Tudo a ver 
Colar,
passeia pelo pescoço e colo,
espia,
penetra roupa a dentro.
Busca o perfume, Escorrega.
Regina Burghi

UIVO

Uivava por qualquer coisa. Ficava bravo uivava, ficava triste uivava, raivoso, desanimado, uivava por tudo. Ela achava engraçado. Não conseguia condoer-se de alguém que uiva. Estava acostumada com tristeza, com choro, com pessoas que tinham dó de si mesmas, mas não com uivos. Conversou com ele, explicou, queria que ele entendesse que para ela, a linguagem dos uivos era incompreensível. Mas de nada adiantou. Os uivos continuaram. Alguns eram seguidos de acessos de silencio profundo em que nenhuma aproximação era considerada digna de atenção e, conseguisse uma conversa, era seguida de novos uivos. Quando enfim voltava a calmaria ele parava de uivar e este sim era o ele que ela gostava. Porém, a qualquer momento, por quase nada, os uivos voltavam. Ao primeiro uivo da ultima série, saiu de perto. Foi indo, foi indo e se foi. Até hoje quando se lembra acha engraçado. E ri. Mas chegar perto de novo, nem pensar! Uivo não!
09/03/09

quinta-feira, 5 de março de 2009

Droga

Olhou para o céu e viu frases escritas em rosa choque e azul turquesa pensou que lindo, que lindo e quando abaixou os olhos novamente viu um pavão que abria a cauda, barulhento, bem em frente a ela, levou um susto enorme! 
Medo foi o que sentiu mas, no mesmo instante, começou a escutar uma musica alto e falou vamos, vamos, me leva aonde está a musica. 
Ele, fingindo que acreditava foi com ela e quando ela tropeçava em buracos que não existiam, a segurava forte pela cintura. Chegaram a uma praça não havia musica mas ela disse tem sim, estou escutando! Vamos dançar. 
Ele ria, ria, como ele ria! Dançou, fazer o que? Se ela escutava, ele podia fingir que escutava também mas não disse nada. 
Ela escutava e cantou com a musica, ele dançou, deliciado. Delicia dançar na praça com ela. Dançaram, dançaram, ela cantou, cantou, ele cansou, ela não, e então ele disse: vem, vou te levar pra casa. 
Entraram na banheira e a água fazia cócegas, ela não conseguia parar de rir e ele só olhava achando graça,colocou musica, ela adorou, mergulhava na banheira e ria porque sentia cócegas, ele disse vem, secou o corpo dela, secou os cabelos. Ela fechou os olhos e devaneava, fez poesias, recitou para ele, ele ria, deliciado. 
Sentaram-se no terraço e as luzes da cidade brilhavam, ele disse olha as luzes, ela viu em cada luz um monstro e correu para o colo dele ele disse calma, é só luz! 
Ela ficou com vontade de chorar e pediu não sai de perto de mim, ele cantou e ela se acalmou e ele nunca mais se esqueceu daquela frase, não sai de perto de mim, não sai. 
Levou-a para a cama, cantou para que ela dormisse e ficou com ela. Não saio. Não saio nunca mais de perto de você.
  5/03/09

segunda-feira, 2 de março de 2009

Esturricado

Viu um pedaço queimado, seco, acabado, jogado. Não sabia o que era, chutou. A coisa gemeu. Assustou-se, correu, parou, voltou, cutucou com o pé. Nada... Então, chutou longe. Um grito acompanhou o vôo. Assustado correu, o mais que pode. Ao longe parou, peito arfando, coração disparado e,não resistindo, mais uma vez voltou, procurando pelo chão. Andou bastante até que escutou o gemido. Foi atrás com medo, mas foi, devagar. Viu a coisa, quieta, no chão. Parou ao lado “geme agora, geme!”. Silencio. Abaixou-se para ver melhor e foi chegando cada vez mais perto. Uma coisica de nada! Perdeu o medo. Cutucou com o dedo, pegou, entre o polegar e o indicador. Foi então que a coisa soltou uma labareda e gritou. Ele também gritou, largou a coisa, os dois dedos pegando fogo, tentou apagar socorro, socorro, os dedos queimando, correu, mas como correu!!! Quando conta ninguém acredita nem quando como prova, mostra o polegar esturricado. 2/03/09

domingo, 1 de março de 2009

O tilintar dos sinos

Lembro-me dele como de um tilintar de sinos. O sorriso sempre presente, os apartes engraçados, o olhar inteligente. Lembro-me de como preparava minha chegada e me abria os braços, a alma, a casa. Lembro-me do café da manhã que preparava com cuidado e de como me presenteava com pequenas novidades. Lembro-me das noites no sofá em que palavras jorravam por horas sem fim, risadas ecoavam e havia sempre algo de novo para perguntar e para contar. Lembro-me dos abraços, dos beijos intermináveis e do amor apaixonado que nos transtornava e nos fazia por vezes, perder a noção dos rumos. Lembro-me dele a contar do passado e a me fazer sentir que o presente, comigo, era momento de vida incomparável a qualquer acontecimento anterior. Lembro-me do tanto que crescemos juntos em todas as direções e do tanto que trocamos de nossas belezas interiores. Lembro-me de sentir-me plena e de sentir, com ele, a plenitude. Hoje revi em fotos o seu sorriso e com ele sorri perdendo-me em lembranças e, como quem não acha o caminho de volta, pus-me a lembrar dele, ouvir-lhe a voz, reviver momentos. Então as musicas dele encheram a casa, aumentei o som e abri todas as janelas. Deixei que entrassem os raios de sol, o vento e os pássaros, dancei pelos cômodos e me deixei voar, rodopiando. Os sinos tocaram alto, meu corpo se encheu de borboletas, a alegria me invadiu por completo, levantei meus braços e agradeci, alto e forte, por ter aprendido para sempre, o que é ser feliz. 01/03/2009

Estréia

Lembro-me dela como de uma sombra. Ar triste, economia de gestos, um pedido de licença sempre presente nos olhos e no movimento dos lábios.
Lembro-me do rosto coberto de lágrimas que escorriam acompanhadas de silencio total. Lembro-me dela a contar-me o quanto procurava fazer sem conseguir, o quanto queria mas não podia, o quanto esperava mas não recebia.
Lembro-me dela a desdizer da vida, do amor e da felicidade, causando-me dor. Assim me lembro dela.
Hoje a vi exuberante, rosto corado, sorriso nos lábios. Gestos largos, falando alto e confiantemente. 
Hoje a vi a fazer rir todos que a cercavam. 
Hoje admirei seus gestos, sua fala e sua postura.
Cheguei perto e sorri.
Abraçou-me, abraço apertado, saudade de mim, lembrança de si.
Então me disse que nesta noite estreava vida nova. Nunca mais seria a mesma.
Eu a abracei, abraço apertado, surpreso com ela, 
lembranças sem fim.
Sorriu-me, surpresa comigo, que sorrindo a ela, nem coube em mim.
13/08/08

Cuidados

Mimava eu,
cuidava d’eu
queria eu
beijava eu.
Era então qu’eu
dele cuidava
queria ele
e ele amava
e então a gente
se acarinhava
de nós cuidava
e se entregava.
A gente se dava!
e se aceitava
e se tomava.
Não sei que foi que’aconteceu
o que se deu que se perdeu.
Num sei mais dele
nem sei mais d’eu

26/05/08