Vez em quando me olha com um olhar desligado do resto do corpo, sabe como é? Um olhar vazio, sem fundo, como se pudesse ser ultrapassado e, olhando através dele, nunca se chegasse a um fim. Melhor não encarar. Dá medo. Você já viu um olhar assim?
O dele, na maioria das vezes tão acolhedor, num repente consegue transformar-se a esse ponto. Nessas horas imagino que o interior da cabeça que consegue produzir aquele olhar, deva estar repleto de um liquido escuro e pastoso em ebulição constante, você não acha?
Nesses momentos, quando chega perto de mim sinto a tensão sem nem precisar olhar aliás, nem olho, grudo meus olhos no chão e paraliso meu corpo.
Talvez pudesse ajudar, talvez pudesse mas sinto tanto...e penso: meu querido, não posso mover meus passos por esse atroz labirinto que se tornou a sua mente então perdoe-me, eu me afasto.
Não sei o que poderia acontecer se não me afastasse, sabia? Devo ser covarde, vou saindo, disfarço, vou embora. Como dizer a ele que tenho pavor daquele olhar? Como dizer a ele que a cada vez que isso acontece penso em não voltar nunca mais? Você acha mesmo que devo dizer?
Fico aqui pensando: de onde virá este medo? Não vou dizer o que eu penso porque na verdade eu sei, aqui dentro, eu bem sei: tenho medo é de olhar nos olhos dele porque aquele olhar vazio chama o meu e um olhar meu, firme, vai me fazer mergulhar dentro dos olhos dele, vou sair de mim, vou entrar no liquido pastoso daquela cabeça, vou misturar meus pensamentos nos dele e ai! Não quero!
Ai que medo de mim!
Ai que medo! Eu heim?
Eu é que não quero ver aqueles olhos vazados!
Tita - 28 de março de 2010
photo: near death experience
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