domingo, 29 de abril de 2012

Encontros

Grandes encontros são aqueles em que palavras não são necessárias.
São raros, fluem sem travas e não necessitam tentativas e considerações.
Em grandes encontros os corpos se falam, se atiçam e se procuram,  
unindo-se em meio a risos e leveza.
Grandes encontros são momentos em que a chance acha morada,
a completude toma conta e as almas se unem.
Então os pensamentos seguem para o mesmo lado,
os objetivos tornam-se iguais
e todos os sentimentos ficam expostos
explodindo em sons,
de todas as escalas,
em todas as cores.

Tita 29/04/2012

Tudo a ver
Beija-mas bem!... Que fantasia louca 
Guardar assim, fechados, nestas mãos, 
Os beijos que sonhei pra minha boca!...
Florbela Espanca


quinta-feira, 26 de abril de 2012

HAIKAI IV

私は影を踏む


Na noite escura
A lua espalha luzes.
Eu piso sombras


Tita 26/04/2012

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Emaranhado

Ele frágil,
e minha eterna fortaleza .

Meu homem pequeno e grande,
meu amigo velho e menino,
meu menino sempre pequeno,
meu ausente sempre querido.

Ele meu amor sentido, doído,
um amor sem nunca ter sido.
Minha dor sempre presente,
meu presente sempre ausente.

Ele, minha constante saudade,
minha inconsistência e leviandade.
Minha fuga, minha solidão sem cura,
minha eterna procura.

Ele, meu desamor,
minha infinita loucura.

Tita 24/04/2012
f
Tudo a ver
...
Como um Sol
que apenas existe
na sua própria ardência,
eu sou só amando.

A minha luz é um luar
à procura de outra lua

Mia Couto em - idades, cidades, divindades - Astros


terça-feira, 24 de abril de 2012

Equilíbrio


Talvez tenha ido embora com você a minha chance. 
Aquela, que esperei por todo o tempo que vivi, antes de conhecê-lo. 
Talvez eu não tenha percebido que você a carregava assim, como uma coisa delicada ou, quem sabe eu, desastrada, a tenha derrubado e, por te-la derrubado, não lhe dei a devida atenção?
Você sabia bem melhor do que eu que a chance estava ali. E mostrou-me e disse, várias vezes.
Foram tantos disparates e tantos desencontros dentro daquele que foi o maior encontro...
Hoje sei que estava presente nas palavras infindas dos olhos brilhantes, na vontade do contar que nos mantinha acordados e alertas, na alegria que nos prendia e nos fazia crianças, no vazio que acontecia quando nossos corpos separados. 
Havia em tudo a grande chance que, com você, se foi.
Aonde você a colocou? Jogou fora? Escondeu? 
Diga-me por favor. 
Preciso encontrá-la para aprender a carrega-la com a delicadeza que só você sabia. 
Preciso equilibrá-la em minhas mãos para quem sabe, um dia, encontrar a quem oferecê-la.



segunda-feira, 23 de abril de 2012

Escrever?

Saber o que escrever?
Escrever, saber o que?
O que escrever? Saber.
O saber. Que escrever?
Que saber! O escrever.
O que saber? Escrever.
Escrever o saber. Que?
Escrever que saber? O...
hic...hic....hic

Tita - 23/04/2012

Tudo a ver
"...ao escrevermos, como evitar que escrevamos sobre aquilo que não sabemos ou que sabemos mal? É necessariamente neste ponto que imaginamos ter algo a dizer. Só escrevemos na extremidade de nosso próprio saber, nessa ponta extrema que separa nosso saber e nossa ignorância, e que transforma um no outro... Suprir a ignorância é transferir a escrita para depois ou, antes, torná-la impossível."
Giles Deleuze, Diferença e Repetição, Graal, 1988

domingo, 22 de abril de 2012

Madrugada

Como é imprevisível a noite!      
Pessoas pela rua, carros, buzinas, movimento...
Não esperava encontrar, neste avançado da hora, 
o movimento do dia.    
São três horas da manhã e dirijo alegre, 
perdida na madrugada.
Feliz e, comigo mesma, chego bem em casa, 
ainda inserida na conversa  recheada de perspicácia e alegria 
(talvez, muita bebida?)
   Sim, esta é a cidade que escolhi.
Porque pulsa,
                                        como eu!                                          

 Tita, madrugada de 22 de abril de 2012


sábado, 21 de abril de 2012

Posse


Como se há muito esperasse por um momento seu de distração, desabou as palavras sobre ele, pegando-o desprevenido.
Momento inesperado.
Então entonteceu e a vista ficou turva. Não soube o que dizer e teve sono, muito sono. 
É o que lhe  acontecia nestas horas. Um sono pesado e incontrolável apossava-se dele. Nada pensava, dizia ou fazia. Queria sucumbir, entregar-se ao vazio, dormir, nada mais. 
Porem, a musica tocava e por isto, só por isto, sabia que faria um esforço enorme para não fechar os olhos. Musicas tinham um estranho poder sobre ele e, por mais que desejasse entregar-se, deprimir-se ao ultimo grau, esquecer e abandonar-se, a musica não permitiria. 
Rendeu-se ao som. 
Abriu os olhos aos poucos, sabendo-se pequeno na sala leve e enorme. A musica grande, apossando-se dele, invadindo seu corpo e todos os seus espaços escondidos. 
Ainda com os olhos turvos e o coração tão diminuto que parecia pararia a qualquer momento, deixou-se tomar. 
Levantou-se devagar e começou a dançar, lentamente.  
Enquanto houvesse musica...


Tita 21/04/2012


quinta-feira, 19 de abril de 2012

Asas Abertas


ウィングのオープン
0
Novo momento
Sensações vagas
Sentimento ao vento

Tita - 19/04/2012


Tudo a ver
Devemos supor que existem certas lições a serem tiradas do amor, ou senão continuaremos felizes em repetir nossos erros indefinidamente, como moscas que enlouquecem batendo as cabeças contra vidraças, incapazes de compreender que, embora o vidro pareça claro, não pode ser atravessado.
Alain de Botton em "Ensaios de amor"

terça-feira, 17 de abril de 2012

Haikai III

s
空でハート
s
Silencio no ar
Barulho de solidão
Coração vazio

Tita 17/04/2012


Tudo a ver
" Por que você me ama apenas um pouco?
Como você faz para amar um pouco?
Amar "um pouco", que quer dizer isso afinal?
Vivo sob o regime do "demais" ou do "não-suficiente"; 
ávido de coincidência, tudo o que não é total parece-me parcimonioso; 
o que procuro, é ocupar um lugar a partir do qual as quantidades
não possam mais ser vistas e do qual o balanço esteja banido"
Roland Barthes em "Fragmentos de um discurso amoroso"

domingo, 15 de abril de 2012

Haikai II

      俳句       

Juntam-se almas
Em completo encontro
Rimando, calmas.

Olhar, sedução
Chamas a se acender
Nascendo paixão.

Tita 
15/04/2012

terça-feira, 10 de abril de 2012

Eucalipto



Naquelas férias os dias e noites cheiravam a eucalipto.
Havia musica dedilhada ao piano com força, canto,
 passeios de bicicleta, amigos cheios de vida, risos, danças e  arroubos de amores de verão.
Naquelas férias os dias e noites cheiravam a novidade.
Calor e água fria da piscina lavando a noite pouco dormida, acordando o corpo para o novo dia com sempre surpresas.
Naquelas férias, as musicas causavam arrepios e os beijos tomavam todos os sentidos. 
As vozes gravavam-se nas mentes e os rostos permaneciam vivos a cada pensamento.
Então eu respirava fundo porque, diziam, eucalipto fazia bem  para os pulmões. 
Puxava o ar com força e fechava os olhos. Enchia o peito e tinha a certeza de que aquela saúde que entrava, jamais me abandonaria. 
Naquelas férias os dias e as noites cheiravam a inesquecíveis 
e assim se tornaram.
Só de lembrar, o corpo se arrepia.
Então, canto aquela musica e teço devaneios.
Só porque coisa boa é muito bom de lembrar.

Tita 10/04/2012

domingo, 8 de abril de 2012

Vida?

Um dia nos renderemos.
Recolheremos nossas asas,
limitaremos nossos pensamentos.
Deixaremos de nos lembrar,
de noites vadias,
de peles macias.
E nos abandonaremos,
a contemplar a vida.
Vida?
Tita 07 04 2012

sexta-feira, 6 de abril de 2012

O amor morre


Como morre o amor?
Assim, devagarzinho, 
antes de começar.
.
死亡
Morre
com idéias não trocadas,
e falas impensadas.
.
の死
Morre
em incentivos inexistentes,
comentários insipientes.
.
死の
Morre
simplesmente porque,
nem devia nascer.


Tita 06/04/2012

Tudo a ver
Hoje, tem algo errado?
Não, por que? Tem alguma razão para isso?
Acho que não
Então por que está perguntando?
Não sei. Porque você está parecendo um pouco infeliz
Alain de Botton em "Ensaios de Amor"

Hai....kai....


  • Café no fogo
    O cheiro anunciando
    Um dia novo

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    Mal amanhece

    E já meu pensamento

    Futuro tece


    ..............................................................

Que dia lindo
Pena que me lembra
Amor já findo
.................................................................

Se eu já me vou
É porque nada resta
Do que se passou
..................................................................
Mas por que me quer
Se de mim só recebe
O que me aprouver?
................................................................
                         
Um quadro torto
Na parede lembrando
Amor já morto


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Tita 06/04/2012

Tudo a ver
"Os poetas japoneses sabiam como expressar suas visões da realidade numa observação de três linhas. Não se limitavam a simplesmente observa-la, mas, com uma calma sublime, procuravam o seu significado eterno. Quanto mais precisa a observação, tanto mais ela tende a ser única, e, portanto, mais próxima de ser uma verdadeira imagem. Como disse Dostoievski, com extraordinária precisão: A vida é mais fantástica do que qualquer fantasia.
Andrei Tarkovski, no livro "Esculpir o Tempo"
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segunda-feira, 2 de abril de 2012

Recheios

   
Contou-me dos dias em que descobriam uma nova vida no sertão, daquelas tardes, cavalos apeados na beira do córrego, os dois a desbravar o novo, no  meio do mato, no córrego raso, deleitando-se com o inexperimentado.
Soltos, leves, em um saciar das curiosidades, experimentar de gostos, de sabores, de gestos, de valores.
   Foi com ele, disse ela, que conhecera a possibilidade de usufruir do desconhecido. Foi com ele que aprendera a percorrer caminhos, em todos os sentidos do descobrir da vida.
   Eram da mesma estirpe e, sem temor algum, experimentavam e viviam tudo o que criavam em suas mentes.
   Enquanto a escutava pensei na importância das cabeças irmãs, das logicas que seguem meandros parecidos; das mentes que conseguem movimentar caminhos e, pegando no ar as mudanças de direção dos pensamentos, seguem em segundos as propostas de rumos inéditos; entendem-se num rápido olhar.Um comungar de idéias que consegue preencher os vazios e rechear futuros com a certeza de que não serão estáticos e terão sempre novos e variados recheios.
   Então pensei nos recheios, cujos vários ingredientes formam gostos diferentes. E pensei que a receita básica pode ser a mesma mas, os temperos, que sejam únicos, saborosos, instigadores e surpreendentes. 
Só assim, saciarão totalmente a fome.

Tita - 02/04/2012

Tudo a ver
"Me gusta la gente que vibra, que no hay que empujarla, que no hay que decirle que haga las cosas, sino que sabe lo que hay que hacer y que lo hace"
Mario Benedetti


Sem cor

Tantas vezes juntas ao longo da vida e não me lembro da cor dos olhos dela. Como é possível? 
Estranho, aquele olhar. 
Percebi quando, aos dez anos, sentou-se pela primeira vez no meu colo para pentear meus cabelos.
Hoje nos vemos pouco porém, aparece por aqui sempre que algo de ruim lhe acontece e então, ainda hoje, senta-se no meu colo e penteia meus cabelos. 
Caso esteja bem telefona-me vez ou outra, alegre, contando coisas, rindo, dizendo-se feliz.
Mas eu sei, ah se sei! Há algo de estranho naquela voz, tão estranha quanto o olhar que não me lembro que cor tem.
Eu me lembro bem de que quando fala, nem olha nos olhos. Aliás, finge que olha, mas eu sei! 
Eu a conheço e sei coisas dela que nem mesmo ela imagina que alguém saiba. Eu sei porque vi, muitas vezes. Mas não comento, que não sou de comentar, e além do mais (coitada) teve motivos, uma vida sofrida isso sim foi o que teve.
Por isto estranhei quando telefonou ontem calma, tranquila, não parecia a mesma. Então contou-me que foi contratada por uma empresa grande, salário bom, perguntei mas vai fazer o que? Vender livros, falou! Você não sabe da paixão que eu tenho por livros? Sim, eu sei... Desde bem pequena lia muito, até compulsivamente, qualquer livro, qualquer anuncio, qualquer revista, trancada nos quartos, no banheiro... Dava-se bem com os livros mas vende-los? Saberia? Diga, como foi que conseguiu o emprego? Entrevista? Aonde? Uma mulher? Que perguntas ela fez?
Disse-me que contou tudo: sua vida, a infância difícil, o casamento, os filhos entristecidos, a terapia, a mãe criança, o pai alcoólatra, o choro que chega por vezes sem motivo (mas você contou isso? Numa entrevista de trabalho?). Contou. Contou muito de si. 
Mas eu sei que aquilo, ela não contou. Não contou porque pensa que ninguém sabe. E eu sei que não olhou nos olhos de quem a entrevistou. Sem duvida fingiu olhar e enganou bem porque, tivesse olhado firmemente, quem quer que seja teria visto aquele algo tão estranho naqueles olhos que eu não me lembro de que cor são. Aonde será que aprendeu a olhar esse olhar que quando não quer ser visto não se mostra?
De qualquer maneira, é bom que tenha conseguido o emprego! Espero que dure. Os últimos duraram tão pouco... Com o tempo (pouco) as pessoas percebem que há algo que incomoda, e muito. Ficam desconfortáveis porque não conseguem descobrir o que é...
Eu sei mas não digo. 
Então acontece como sempre, vem me ver chorando, senta-se no meu colo e nada diz. Vai ver sabe que eu sei...Penteia meus cabelos em silencio enquanto lágrimas escorrem, tantas que chegam a molhar minha roupa. Não digo nada. Acaricio seus cabelos e, devo confessar, choro com ela.
E rezo, isso mesmo, rezo para que em alguma próxima entrevista seja lá quem a entreviste não perceba o que eu sei e dê a ela a chance de ser contratada novamente. Quem sabe algum dia consegue realmente superar tudo aquilo?
Mas de que cor mesmo são os olhos e por que será que eu não me lembro que cor têm?

Tita- revisitado em 16/04/2012

Tudo a ver 
Quero ver
esse lugar
onde se não vê
para que
sem disfarce
a minha luz se revele
e nesse mundo
descubra a que mundo pertenço
Mia Couto em "Raiz de Orvalho e outros poemas"