Foi embora aos poucos (queria mesmo ir?).
Andou devagar, o corpo ereto, as calças maiores do que seu corpo (como sempre),a camiseta exageradamente comprida.
Enquanto caminhava puxou a camiseta muitas vezes para baixo (como era de costume), e acendeu um cigarro.
Havia decisões que eram dificeis de tomar e esta fora a mais dificil delas. Não olharia para trás. Quando chegasse ao cruzamento dobraria para a esquerda e seguiria, conforme havia planejado.
Não era sempre que planejava seus passos mas desta vez, estava decidido.
Lembrou-se do telefonema na noite anterior. Bebera demais e dissera tudo o que prometera a si mesmo que não diria. Andava bebendo muito ultimamente. Definiu que não se deixaria levar pela bebida novamente (conseguiria?).
Entrou em casa e fechou a porta atrás de si. Finalmente, pensou, chegara ao seu refugio; a porta bem fechada não deixaria que o mundo la de fora invadisse sua tranquilidade.
Era ali que se sentia bem e era dali que não deveria ter saido. Tantos anos se haviam passado e ainda repetia o mesmo erro, vezes sem fim.
Sentiu-se desamparado e pequeno, com saudade do carinho que perdera, da epoca em que os dias corriam tranquilos (mesmo que repetitivos) e das conversas gostosas ao entardecer.
Mas era passado e ja tão remoto que as lembranças muitas vezes transformavam-se em cenas gastas, quebradiças e sem cor. Não conseguia mais lembrar-se do som das vozes daquela época. Mas era naquela época que gostaria de estar.
Sentou-se e fixou os olhos no horizonte, que podia ver através da janela.
Quem sabe algum dia conseguiria livrar-se das lembranças do passado...( será que queria?)
Era tão reconfortante perder-se nas recordações, olhar os objetos colocados como sempre haviam sido, reviver os momentos... Lembranças lhe faziam companhia e, a cada vez que procurava livrar-se delas, perdia-se em si mesmo.
Ficaria ali, cercado de tudo o que ja o fizera feliz, mesmo sabendo que o melhor seria animar-se e começar tudo de novo.
Nada voltará a ser como antes, falou alto, procurando acreditar no que dizia.
Colocou a musica que fizera parte dos sonhos que um dia havia realizado e abriu uma garrafa da bebida preferida.
Algumas horas depois, embalado pelo alcool e pela musica, chegou a acreditar que sim, era tudo como antes. Pegou o telefone e disse de novo, tudo o que prometera a si mesmo que não diria
04/05/2012