quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Debaixo da Mesa



Quando eu era pequena gostava de brincar debaixo da mesa. Algumas vezes escondia-me ali e, sem que percebessem, escutava a conversa dos adultos enquanto almoçavam ou sentavam-se para jogar cartas. Era gostoso ficar ali, sentindo-me abrigada e protegida. Ao mesmo tempo em que transgredia regras, por estar escondida e escutar conversas que não me diziam respeito, estava protegida por eles e nada de ruim poderia me acontecer. Algumas vezes cheguei a adormecer e acordar apenas quando escutava vozes aflitas me procurando pela casa. Então saia sem que me vissem e fingia estar dentro do quarto ou do banheiro, para que nunca descobrissem meu esconderijo.
Depois de muito tempo, já adulta, houve um dia em que entrei debaixo da mesa em uma situação completamente diferente daquela de minha infância.  Foi durante uma queimada.
Você já viu uma queimada?
Norte do Brasil, fazenda só mato, filha bebê. Derrubada de mato feita na foice, no facão, na moto-serra. Toda a vegetação para o chão. Verde caindo, barulho de árvore tombando. Depois silencio. Tudo aquilo que tinha sido decepado ainda com vida, resta tombado no chão para secar castigado por dias e dias (cerca de dois meses) de sol.
Até que chega o mês de agosto, mês da queimada. Acero para o fogo não passar para as fazendas vizinhas, pessoal saindo para todos os lados da fazenda, todos prontos cercando a área seca e, a um sinal, tacar fogo!
De longe, bebê no colo, vejo tudo parada no vão da porta da cozinha. 

Sobe densa e negra a fumaça do fogo. Barulho de estalos, fuligem começa a cair. Sentamo-nos no degrau, o bebê e eu, ambas quietas, meus olhos nostálgicos e os dela incrédulos. Eu digo: estamos queimando o mundo! Ela aponta a fuligem e diz “óia”.
Então acontece, num repente. Do meio do cinza surge uma fumaça que dá voltas, cada vez mais concêntricas e mais rápidas. Um rodamoinho, um funil que caminha para todos os lados e vem vindo, meu Deus, para fora da queimada, para cima de nós. Vem vindo, não é possível, como? Vai sair de lá? Vem! E sai do mato e entra para o quintal e corro eu com o bebê no colo para debaixo da mesa.
Barulho, vento zupt, zupt, zupt, barulho redondo, como explicar esse barulho? Passa pela casa, ventania, telhado se abrindo, sobre a mesa telhas e telhas estilhaçadas.
Depois silêncio.
Embaixo da mesa minha bebê e eu, incrédulas.
O rodamoinho passou. Destelhou metade da casa, nenhum estilhaço nos atingiu.
Saímos do esconderijo de gatinhas. Ela diz óia, óia, óia, e eu penso: é a natureza que se revoltou.
Tita 

Tudo a ver
Ter idades
é estar perto de tudo
e não tocar
senão esse turvo espelho: saudades
Mia Couto em "idades, cidades, divindades" - A Dor do tempo.



segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Como?

google images

Como serão aqueles beijos e o caminhar daquelas mãos quando em desejo?
Como aqueles olhos quando em busca de respostas para os chegares de seu próprio corpo?
Como será seu movimento quando em busca de união e pertencimento?
E como o olhar e a fala, aquela voz, quando em aconchego e êxtase?
Como?

Tita - 2014

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Please

foto: Ana Mellone

Please
Be good and let me know
Cause your eyes will never show
The way
You feel

Tell me
What you think of us
Cause I will never guess
What you
Can plan

I
Would never let you go
If only I could know
What you
Stand for

Cause
We're always so unlike
To share the known way
Of sharing things

And
I'll always fly away
Although I'll never say
What you don't mean

So
Let's live what we can have
Untill our life won't take
Our parts away

And
Let's feel the good there is
Cause you know that this is
The way we are

Then
Let's give what we can give
And take the good to take
Until we are
Apart

Tita 09/01/2013

Tudo a ver
"Because I know that time is always time
And place is always and only place
And what is actual is actual only for one time
And only for one place"
T.S.Eliot em "Selected Poems - 1930"