quarta-feira, 18 de junho de 2014

A Ponte



Estaiada?
É, es-ta-ia-da.
Tem certeza?
Tenho, absoluta.
Eu acho que está errado. Acho que é Espraiada.
Espraiada? Que ridículo! Não é. Você está errado.
E como é que você sabe:? Me irrita esta sua mania de sempre saber tudo.
Não é mania. É só procurar no dicionário, no google, na net. Seguinte, cara, é estaiada, porque foi construída com estais!
Escutei esta conversa numa manhã de domingo, tomando café em uma padaria do Brooklin. Num impulso, quase virei minha cadeira para a mesa atrás de mim e perguntei “o que é isso,“estais””? Mas não me atrevi, domingo de manhã, os dois irritados implicando um com o outro, voz nada amigável...
Por que não prestei atenção nas noticias de jornal que descreviam a ponte? Mania de ler tudo rápido! Fiquei quieta. 
Estais...
Voltei para casa e lá fui para o google, procurando de várias maneiras, digitei “estais”, encontrei: “Ponte estaiada, é uma ponte que está suspensa por cabos conectados a um mastro para sustentar as pistas”
Então, conclui, os cabos são os estais, neste caso.
Que coisa boa morar numa cidade como São Paulo e viver sempre aprendendo. Não fosse ter escutado aquela conversa nunca saberia o que são estais, eu, que de engenharia não entendo nada. E quantas outras coisas escuto, leio em manchetes de jornais e revistas quando passo pela banca!
Não, eu não poderia morar fora desta cidade, por mais caótica que seja. É dessa diversidade e “caoticidade” (adoro inventar palavras) que tiro o alimento para meu cérebro, para minhas conversas e para escrever cronicas como esta.
A verdade é que a palavra me acompanhou durante toda aquela semana: reparei incansavelmente nas construções, será que só pontes tinham estais? Conversei com amigos, perguntei se sabiam o que era (e não é que a maioria sabia?) compus versinhos e frases mentais (aonde estás?  Estarás nos estais? Se estás nos estais, isto te apraz (pronuncie "apraiz")? e, reconhecendo minha falta de atenção para termos técnicos, prometi a mim mesma reforçar a tensão quanto a leituras a este respeito enfim, obcecada pela palavra, passei a semana inteira ruminando o assunto.
Na sexta-feira esperava um amigo na porta do cinema e quando o vi ao longe, alto e magro,  imediatamente  pensei: parece um “estal” (existe “estal” ou só “estais”?) e, num repente, escutei minha própria voz: “Oi! Que bom te ver! Como estais?”

Tita - Escrito em 2010

Tudo a ver
Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no Universo... 
Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer 
Porque eu sou do tamanho do que vejo 
E não, do tamanho da minha altura... 
Alberto Caeiro em "Eu sou do tamanho do que vejo"

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Escuro



A menina na sala escura
acendeu a luz e desenhou tragédias.
Tomada do espirito da invenção e do drama,
escreveu terrores e suspirou dores que não sentiu.
Fez-se mulher a que, menina, se fazia velha.
A velha que, menina, acendeu a luz. 

Tita - 11/06/2014


Tudo a ver
Quando as luzes se apagam é menos perigoso  
Kurt Cobain

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Ha!


Em você me decifro.
Nesse jogar de palavras esparsas,
nesse olhar impensado,
nesse andar de pernas trançadas
e, mais ainda,
nessa lágrima perdida,
nesse gesto sem nexo,
nesse hahaha perdido no tempo.


Tita - 09/06/2014

Tudo a ver

"Irei até onde o ar termina, irei até onde a grande ventania se solta uivando, irei até onde o vácuo faz uma curva, irei aonde meu fôlego me levar."
Clarice Lispector em "A Hora de Estrela"