quarta-feira, 30 de julho de 2014

Equilíbrio

Equilibrio - Diego Sevilla Ruiz
Parecia tão leve andando com aqueles saltos enormes, altos, exagerados...
Eu atrás, não conseguia tirar os olhos daqueles passos.
No fundo, esperava a hora em que iria bambear, tropeçar, cair. Porém, nunca titubeava nem perdia o equilíbrio, seguia firme sobre o que pareciam ramos de alguma árvore esguia e roliça.

Talvez eu tivesse vontade de conseguir equilibrar-me da mesma forma...
No fundo o que eu esperava era que acontecesse com ela o que, imagino, aconteceria comigo porque, caso acontecesse, eu não seria a unica e poderia então sentir-me pertencente ao mundo dos que nunca se desequilibram.

Continuou andando por quadras e quadras e eu atrás, até que meu pensamento correu e a perdi de vista. Lembrei-me das vezes em que, mesmo com os pés no chão, não consegui me equilibrar. Porem ha momentos em que fico tonta, perco o rumo e, sem ninguém que me segure, calço os sapatos sejam altos ou baixos, respiro fundo, estico o corpo e sigo, eu também, me equilibrando firme, sem bambear nem tropeçar, pelo continuar da vida. 

Tita 30/07/2014

terça-feira, 29 de julho de 2014

A primeira morte


Lembro-me dos sons daquela morte.
As falas, os passos apressados pelo corredor, um subir e descer de escadas. Pessoas entrando e saindo, diálogos sussurrados, movimento cuidadoso de estranhos. Ao longe, palavras esparsas, um certo silencio permeando tudo.

Sentindo uma estranheza nunca antes experimentada e tudo vendo de uma perspectiva torta mas perspicaz, desviava apressadamente o olhar para não ver o que diziam os olhos que, ao encontrar os meus, mostravam uma expressão de comiseração, ou algo que eu não sabia o que era, mas que fazia com que me sentisse inesperadamente inadequada.

Perambulei sozinha, subi e desci as escadas, perdida.

Procurando refúgio não encontrado, escondi-me em minha própria mudez, guardando as perguntas até hoje sem respostas e escutando, alto e forte, o som do meu pequeno coração, irremediavelmente descompassado.

Tita 29/07/2014


Tudo a ver
Os que amei, onde estão? Idos, dispersos, 
arrastados no giro dos tufões, 
Levados, como em sonho, entre visões, 
Na fuga, no ruir dos universos... 

Antero de Quental em "Com os Mortos"

domingo, 27 de julho de 2014

Beijo

Me da um beijo?
Roubado?
Não. Quero beijo dado.
Dado eu não beijo
Por que?
Porque dado é pensado e beijo pensado já é beijo estragado.
Então roubo um
Não, não rouba!
Por que?
Porque quando avisa que é roubado já vira beijo pensado
Ahhhh. Então faço o que?
E eu é que sei?
Num?
Num.
Então deixa o beijo no ar
Num cai?
Se cair você pega?
Tenho de pensar se pego... Mas se penso vira beijo pensado!
On my God! 

Tita 27/7/2014

Isso



Não fosse isso (apenas isso),
Teríamos um encontro certeiro,
Nos perderíamos num sentimento traiçoeiro
Ou seguiríamos,
Cada qual um inteiro,
Sem jamais dividir
O tão falado travesseiro?

Tita - 27/07/2014

Tudo a ver
Nesta vida tão breve
De que nos dão só um gole
Quanto - quão pouco - está
Sob o nosso controle
Emily Dickinson em "Não sou Ninguém"

sábado, 19 de julho de 2014

Verde



Sonhos sem fim, no vasto jardim de flores pálidas.
No verde a força incontida, incomensurável busca do desfecho perfeito,
os lábios soprando desejos nas árvores fletidas.
No espaço extenso, o coração se estilhaça como vidro quebrado,
ao pressentir no silencio o barulho final.

Tita 18/07/2014

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Distante

Onde teus olhos que com musica choravam?
Onde as palavras que, vindas de ti, em nós transbordavam? 
E teu riso de menino, tua falta de jeito, teus olhos azuis e tuas costas curvadas?
Que mar te acolherá, de mim tão distante?

Tita - 16/07/2014


Tudo a ver
Não, meu bem, não adianta bancar o distante: lá vem o amor nos dilacerar de novo"
Caio Fernando Abreu em "Pequenas Epifanias"  - Extremos da paixão.