segunda-feira, 28 de junho de 2010

Tão


Nós tão diferentes
e, num momento, 
tão iguais.

Correndo atrás dos beijos na rua,
roubando carinhos nas entrelinhas,
surrupiando abraços 
em momentos esparsos,
nos apaixonando tão sofrido!

Tão longínquos e tão perto,
nos podendo em tão poucos,
e tão pequenos momentos!
Nunca o suficiente,
sempre menos,
nunca mais.

Você e eu.
Eu sempre,

tão cá
e você sempre, 
tão lá!

Tita - revisto em 28/06/2010


Tudo a ver
"Corria a certeza que, se quisesse mesmo chegar lá, você dava um jeito e acabava chegando. Só uma coisa era fundamental (e dificilima): acreditar."
Caio Fernando Abreu em "Uma história de fadas" - Pquenas Epifanias 

foto: Não te esqueças de mim: Jorge
http://br.olhares.com/nao_te_esquecas_de_mim_foto3596340.html

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Neblina

Muito difícil explicar, mas tentava.
Procurava usar metáforas, que eram interpretadas por cada um de maneira diferente, repetia, queria que todos compreendessem.
Como fazer entender?
Como dizer da sensação que sentia quando percebia haver um véu, uma poeira, uma nuvem, uma neblina, entre ela e o mundo?
Como explicar o sentir-se apartada de todos os acontecimentos, sendo só alma a perambular no espaço real?
E a sensação do sem corpo, sem respiração, sem sensibilidade, o enxergar de todas as coisas encobertas por um escudo transparente?
Ainda pior: o constatar do não pertencer. A certeza do estar banida. A terrível sensação da solidão que esta situação lhe causava.
Ver a todos e não ser.
Estar ao lado e vagar, em outra dimensão.
Dizer e não se fazer compreender.
Perder as formas do corpo, a lucidez da mente, sentindo por todos os poros um único desejo: 
fechar os olhos e se deixar levar.

Tita revisto em 24/06/2010

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Incongruência

Fiz tudo o que podia.
Tem certeza? 
Absoluta. Fui companheiro, fui simpático, estive ali à sua disposição.
E quem disse que eu queria que você ficasse à minha disposição? 
Não cobrei nada, não me impus em nada, não pedi nada, não exigi nada .
De onde você tirou que era isso que eu queria? 
Eu sei o que Eu quero.
E como vou saber o que você quer se você não diz? 
Você poderia ter prestado atenção.
Prestar atenção no que se tudo o que você demonstrou foi que nada fazia diferença, que qualquer coisa que eu fizesse seria aceita? 
Mas eu falei que não gostei.
Falou no fim, despejando tudo o que deveria ter falado antes.
Mas a culpa é sua, você deveria ter visto, ter reparado em todo o meu esforço.
Você se esforçou? Não demonstrou esforço nenhum. Mostrou apenas passividade, falta de energia, pouco interesse.
E o que você queria?
Queria que você se desse a conhecer ao longo do caminho e que não me deixasse sozinha a traçar as rotas. Queria companheirismo, confiança e sinceridade. E queria sentir que era necessária.
Eu estou com a minha consciência tranquila. Fiz tudo o que podia.
Tem certeza? 
Absoluta.
Então tá! 

Tita - 21/06/2010

domingo, 20 de junho de 2010

Sem soma

Somos um e um,
sem soma.
Não temos  o mesmo caminho
nem somos do mesmo genoma

Por isso beijo sua boca
sem me entregar.
Com você eu pulo as ondas
Mas nem penso em mergulhar

Tita -  algum dia, 2010 
Foto: Olhares - Carina Fernandes
http://br.olhares.com/carinafernandes

Tudo a ver
Não procure, por enquanto, respostas que não lhe podem ser dadas, porque não saberia ainda po-las em prática, vive-las. E, trata-se, precisamente, de viver tudo"
Rainer Maria Rilke em "Cartas e um poeta"

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Relapsa

Deixaria as coisas para depois, esqueceria os óculos, não pagaria as contas, perderia a hora.
Seria ótimo ser, por um mínimo de tempo que fosse, aquela desligada das obrigações para quem alguém sempre faz o que deve ser feito pois ela, por si só, não faria.
Bom seria não abrir a agenda todos os dias, não verificar se os remédios foram tomados, se há mantimentos para o almoço, se os lençóis foram trocados, se há reuniões marcadas, relatórios entregues, telefonemas dados, orçamentos aprovados, contratos em dia.
Que tranqüilidade não ser aquela a quem todos chamam quando há algo a resolver, aquela que organiza os acontecimentos sem nada esquecer.
Um dia, alcançarei a paz desliganddo-me de obrigações, esquecendo-me dos compromissos.
Quem sabe algum dia serei aquela para quem é melhor não pedir nada.
Aquela relapsa, com quem ninguém pode contar.

Tita - 12/03/08

terça-feira, 15 de junho de 2010

Ao pé do bidê

Tinha certeza de que estava ali. Mas não o encontrava. Como podia uma coisa desaparecer assim, apenas com um rápido desvio do olhar?
Olhou em baixo da mesa. Não estava ali. Pensou que o melhor seria esquecer-se do papel por algum tempo. Recostou-se na cadeira e olhou novamente sobre a mesa. Estava lá.
Tinha certeza de que não estava ali há alguns minutos atrás.
Há algum tempo repetiam-se acontecimentos como este, o que o deixava bastante apreensivo. Há duas semanas, quando saíra do banho, a toalha não estava sobre a pia e ele nunca deixava de colocar a toalha sobre a pia ao entrar no banho. Saíra do banho e fora, molhado, procurar a toalha no quarto. Nada. Voltara ao banheiro e lá estava a toalha sobre a pia.
Achava muito estranho o que estava acontecendo. Se contasse a alguém, poderiam concluir que alguma coisa terrível sucedia a ele. Tinha de descobrir sozinho o que se passava pois tinha a certeza de que não era com ele que havia algo errado.Passou a prestar atenção em cada mínimo movimento seu ou ao seu redor.
O inesperado continuava acontecendo. Novamente objetos que mudavam de lugar.
Resolveu anotar. Comprou um bloco e anotava tudo o que fazia e o lugar em que colocava cada
Naquele fim de tarde, ao sair do banho, notou que a toalha, novamente, não estava em cima da pia. Pegou seu bloquinho e leu: “coloquei a toalha sobre o bidê.
Assustou-se. Era ele! Era ele que não se lembrava o que tinha feito minutos antes! Era ele!
Aterrorizado correu, sem roupas pela casa deserta: quero minha sanidade de volta, quero minha sanidade de volta!
Controlou-se, parou, respirou fundo.
Calmamente voltou ao banheiro e procurou a toalha sobre o bidê. Não estava lá.
Foi ao armário, pegou uma toalha limpa e voltou ao banheiro. Amarrou-se, a ele e à toalha, no pé do bidê.
E dali não mais saiu.

Tita, 01/06/2007

domingo, 13 de junho de 2010

Molas

Jogou o corpo, largou os braços, caiu macio.
Pensamentos passando como filme,
som de palavras preenchendo o espaço,
fundo musical qualquer.
Momento de largar o tempo, abandonar o palpável,
perder a realidade.
Apenas sentindo o corpo a cair e re-voar, na impulsão das molas macias.
Voando e caindo, mansamente, a expulsar o ido com brandura e receber o novo. 
Mente vazia, coração aberto.

Tita - 13 de junho de 2010

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Grito

Gritam os vazios de ti, em torno a mim.
No gemer dos galhos das árvores,
no ressoar da tua ausência através dos sons nas ruas,
nas lágrimas escondidas pelo sorriso em minha face,
no lamento preso em meu peito exausto.
Gritam os vazios de ti, em mim.

Tita - 11 de junho de 2010

Foto: Grito - flickr - Wilson Borja

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Na ponta dos dedos


Se te tivesse,
sentir-te-ia aos poucos, com a ponta dos dedos.
Se te tivesse,
dir-te-ia palavras sussurradas,
contando da alegria de ter-te,
da maciez da tua pele.
Se te tivesse,
experimentar-te-ia aos poucos
com a boca,
roubando teu gosto,
para que permanecesse eternamente em mim,
quando partisses.


Tita -  09 de junho, 2010
Foto:Gota sobre o dedo - David Domínguez:
http://www.flickr.com/photos/daviddomi/555158502/

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Silencio

Passeios que não fizemos, viagens que não fomos, abraços que não demos.
Os nãos falados, os ois roubados, os vamos abortados,
carinhos não feitos, olhares perdidos, risos despedaçados.
Palavras não ditas explodem a cada passo, a cada dia.
Abalam, machucam e morrem dentro de mim.
Tita - 07 de junho de 2010 


Tudo a ver
"Que pena que, às vezes, a vida tenha de esperar tanto tempo para renascer da sepultura!
Que pena que às vezes, a vida só tem uma chance depois que a morte faz o seu serviço..."
Rubem Alves em "As viúvas" - O Retorno E Terno

sábado, 5 de junho de 2010

Volta!!

Quando minha cabeça voltar, pedirei que não mais fuja.
E que me conte aonde esteve, que novidades me traz.
Esteve longe, viveu outros mundos experimentou coisas 
que meu corpo nunca sentiu?
Quando minha cabeça voltar, pedirei que me tire da inércia,
e que me traga noticias,
sobre as quais eu possa escrever.

Tita, 05 de junho de 2010


Imagem: Cabeça Trágica - Karel Appel - 
http://www.flickr.com/photos/artexplorer/3019022423/


terça-feira, 1 de junho de 2010

Metamorfose

Quero ser sem rótulo
sem caminho já traçado
e modificar, se preciso,
cada instante planejado.
Quero chegar sem nome fixo,
assumir o do momento,
começar quando quiser,
ou voltar, de esquecimento.
Quero ser um novo ser
se a hora inspirar
e dizer coisas não ditas
se o momento assim ousar.
Quero ter capacidade
de criar a cada dia,
não importa quando seja
nem se alguém se importaria.
Quero dias sem prenúncio,
introdução ou sumário,
cada um, um dia novo,
sem constar no calendário.
Quero coisa inacabada,
para qu'assim permaneça
ou que se não for pra ser,
que se acabe e que feneça.
Não sei se me explico bem
ou se alguém entendeu,
mas eu não quero receita
daquilo que se viveu.
Só quero ser meu ser
Maleável, renovado
e quem quiser compreender,
que permaneça ao meu lado
.


Tita -modificado em 31/05/2010